domingo, 17 de outubro de 2010

Uma Relação de Amor e Ódio - Por Mario Mammana

Não amigos. Esta coluna não se especializou subitamente em textos de auto-ajuda nem em conselheira sentimental. Quero falar hoje da relação de amor e ódio com o bar! Ou com UM bar especificamente. Senta que lá vem história!

Lá pelos idos de 1992 ou 1993, eu que era um voraz consumidor e comprador de discos de vinil, me rendi a um novo formato recém-chegado ao Brasil: Passei a ser um voraz comprador de CD´s. Pois bem. Lembro-me que bem perto da minha casa (pegado ao bar Zeppelin, na Fradique Coutinho) foi inaugurado um pequeno e simpaticíssimo café cujo apelo maior era um display na parede com alguns CD´s a venda. Uma novidade bacana na época! Apesar da indústria ainda incipiente, eram CD´s de muito bom gosto, com o quer havia de melhor na música brasileira e internacional. Além desse importante diferencial, as duas donas do “Café du Revê” eram moças simpáticas e bonitas, fato que aguçava ainda mais a minha vontade de passar de vez em quando por lá. E eu regularmente passei a freqüentar. Tomava um cafezinho (bom, por sinal, em tempos em que ninguém havia ouvido falar em baristas), batia um bom papo e sempre saia com dois ou três CD´s debaixo do braço. Até que um belo dia as duas moças não estavam mais por lá. No lugar delas um senhor negro, alto, simpático e com um chapéu típico africano, cujo codinome era Cidão! Ficamos amigos quase que instantaneamente, amizade que perdura até hoje. Conversei longamente com aquele senhor que me contou que fora recém aposentado como motorista de caminhão e com a grana do fundo de garantia comprou o Café. O resto da história a maioria já conhece!

Tempos depois, por motivos de reajuste de aluguéis, o “Café du Réve” mudou-se para a Rua Deputado Lacerda Franco (nº 293), onde até hoje permanece rebatizado como “Bar do Cidão”.

O bar passou por inúmeros percalços ao longo dos anos. Problemas com a Prefeitura, ausência de alvará de funcionamento, pesadas multas, lei do Psiu, mas incrivelmente sobreviveu. E sobreviveu muito pela tenacidade do Cidão e pela qualidade dos grupos musicais que lá se apresentam. Sempre altíssima! Passei muito tempo freqüentando o bar, tocando ou como simples freguês, mas há muito tempo não ia mais lá. Para quem não conhece, o bar é uma garagem pequena, com azulejos antigos na parede. Depois de problemas com a vizinhança, foi instalada uma porta de vidro na frente e o lugar virou uma sauna no verão. Mas a música, sempre compensou largamente.

Domingo desses voltei lá para dar um abraço no Cidão pelo seu aniversário. Ele já está meio combalido, meio doente e só tem olhos para seu filho mais novo, do segundo casamento, que permanece o tempo todo grudado ao pai. Mas foi ótimo ter ido. Sempre é! A música continua maravilhosa. Quantos músicos fantásticos eu já vi por lá! Zé Barbeiro, Stanley, Roberta Valente, Alessandro Penezzi, Renato Vidal, Amaral, Marcel do Cavaco....e ainda por cima com históricas canjas, algumas que presenciei, de Yamandú Costa, Hamilton de Hollanda, Beth Carvalho e tantos, tantos outros...

Por mais incrível que possa parecer até a atriz alemã Hanna Schygulla, de “O casamento de Maria Braun”, uma vez apareceu por lá, para delírio absoluto dos cinquentões cinéfilos que freqüentam o bar! Tem marmanjo que lembra disso até hoje! Para quem não acreditar, tem foto dela tirada ao lado de um sorridente Cidão (com cara de Fassbinder africano)!

Enfim, a relação de amor e ódio que dá título à coluna explica-se por alguns momentos de irritação que passei lá, por conta da eventual lentidão no serviço, erros na conta e cozinha ruim mas, principalmente e acima de qualquer outra coisa, pelos momentos de felicidade genuína, de êxtase musical (sim, música boa produz endorfinas) e de sincera amizade, em tempos que infelizmente já vão distantes!

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